Não teve jeito! Finalmente, cedi à pressão. Depois de tanta insistência infindável e incessante, realizei o desejo da minha filha millennial, Thalissa, de seis anos:

Dei um IPhone de presente para ela.

Isso mesmo, o MEU! Eu explico.

Fiz uma “aposta da virada” neste último Réveillon: durante 15 dias eternos, entregar nas suas mãozinhas um “pedaço de mim”, ou seja, meu smartphone onipresente e vital. Ela desligou todas as minhas redes sociais, wi-fi, 3G e qualquer aplicativo capaz de me exilar no mundo virtual. Além disso, escondeu-o para eu não ter “recaídas de crise de abstinência”. Ah, e foi um Pacto Transmídia – incluindo tablet, notebook e até a Smart TV.

Perdi o juízo? Pode ser. O resultado da aposta? Prepare-se para as declarações bombásticas de um sobrevivente…

Se morri? Sinceramente? Não. Entrei em “convulsão digital”, beirando o colapso mental? Não. Se tive reações alérgicas de “saudade tecnológica”, insônias descontroladas, erupções pós-traumáticas na pele ou atitudes ameaçadoras? NÃO. Surtei ou deprimi? NÃO. Perdi o mundo ao redor? NÃO!

Não. Não! N-Ã-O!!

Quer saber mesmo? Foi a experiência mais libertadora que saboreei na vida. Não faleci, mas ressuscitei. Nem colapsei, e sim, relaxei. Sumi do mundo? Nada! Achei um verdadeiro paraíso. Não perdi grandes negócios, mas garimpei tesouros ainda maiores. Desatualizei a timeline do meu Facebook por um verdadeiro update familiar. Troquei fotos do Instagram por cliques mentais inestimáveis, e até descobri sons incríveis que não ouvia na minha playlist do Spotify: gargalhadas infantis, sinfonia das ondas, cochichos românticos, sussurros da brisa e muito mais.

Na verdade, fala-se tanto em alimentos desintoxicantes, sucos revigorantes, spas saudáveis e novos hábitos rejuvenescedores, que faltava uma encantadora garota me provocar ao mais importante dos desafios:

O DETOX DIGITAL!

Atropelado pelo tsunami da tecnologia, interação, superexposição, redes sociais e respostas “on-time, on-demand e on-line”, reconheço não notar facilmente o quanto mergulhei no poço sem fim dos hábitos embrutecidos pela digitalização humana. Solução? Ou saltamos deste redemoinho antissocial vicioso em busca de equilíbrio, ou nos baniremos à deterioração extrema dos verdadeiros relacionamentos que – na cultura off-line de outrora – um dia nos fez “à imagem de Deus” (Gn. 1:26).

Vamos às lições do meu reality show particular de detox digital?

shutterstock_321563441ALIENAÇÃO. Palavra dura e incômoda como areia na íris, mas pertinente ao extremo, ela define nossa trágica antipatia social. Ninguém mais parece alguém, a menos que esteja conectado à distância. O problema disso? Só estamos presentes com os ausentes – e quem está ao lado que conviva com nosso “sumiço”. Outro dia, minha esposa me deu uma “bofetada verbal” lendo uma frase: “VIDA é aquilo que passa enquanto você se perde no celular”. Tem gente que, sem perceber, acaba se tornando eremita na clausura cibernética de suas melhores intenções de sociabilização virtual. Viva o presente da presença!

 

IMPACIÊNCIA. Estamos cada vez menos misericordiosos com o tempo de resposta das coisas. Se o sábio disse que “há tempo para tudo” (Eclesiastes 3:1), não parece que isto se enquadre nos grupos de WhatsApp e direct messages do Twitter. Teclamos pra hoje exigindo retorno pra ontem! O perigo é que, de simpáticas ferramentas de interação, as redes sociais se deformam em ameaçadoras armas de obsessão. Quem já não roeu unhas, ou subiu paredes, na ansiedade pelo feedback instantâneo? Calma, take it easy! “Não andem ansiosos por coisa alguma” (Filipenses 4:6). É necessário respeitar o PLM de resposta, ou seja, “período de latência mínima” nas relações saudáveis e construtivas. Fujamos da traiçoeira carência pelo imediatismo que nos larga sufocados, irritados e agressivos (#quemnunca, hein?).

 

shutterstock_196747913FRUSTRAÇÃO. Vasculhar a vida alheia jamais fará alguém se sentir melhor. Ainda mais na “miragem de vitrine” das mídias sociais. Porque ninguém posta lá o que realmente é, mas o que gostaria que fosse. Calma! Não me condene, pois sei que não é sempre assim. A questão aqui é o marketing voltado a uma hiper exposição publicitária de nós mesmos com uma projeção ao estilo “família de comercial de margarina”, lembra? Só que na tentativa de seduzir outros com nossas fantasias de perfeição acabamos devorados pela mesma concorrência alheia dos paraísos idealizados. Para viciados em olhar tudo de todos sempre, postando o máximo de si, a ameaça é se deprimir no “en-Canto das Sereias” dos que mais parecem que são. E se perder seguidores? É melhor do que virar um perseguidor da Terra do Nunca. Não deixe as infindáveis rolagens de páginas com fotos dos outros esvaziarem sua gratidão a Deus pelo que você é e tem.

SOLIDÃO. Apresento-lhe o verdadeiro “mal do século” – depressão e stress viraram vice. Pois o maior desafio é detectar quando a agradável sociedade digital se deforma em isolamento da realidade. É um fenômeno sorrateiramente imperceptível, mas a dependência virtual provoca solitários padecendo de cuidado e controle – numa releitura contemporânea de “correr atrás do vento” (Eclesiastes 2:17). Olhos cansados, mal-humor, desatenção, preguiça, letargia, tristeza e desânimo denunciam limites ultrapassados da geração touch-screen. Confesso que me forcei nos primeiros momentos aparentemente ociosos para “achar o que fazer” além de teclar meu universo paralelo. Porém, foi contagiante voltar a curtir pessoas, sentimentos, toques e imagens reais que passavam despercebidos. Foi quando notei quanta coisa boa, divertida e excepcional eu estava perdendo ao alcance dos meus braços – mais que na evasão dos dedos.

OTIMIZAÇÃO. Do tempo, é óbvio! Surpreende ver quanta energia de ação pode ser capitalizada nos momentos que sobram após reduzir o uso da shutterstock_249491086_pptecnologia virtual. Neste caso, de extremos envolvidos, menos é mais. Tempo não é o que temos, mas o que fazemos com ele. Por isso, pode ser a hora de trocar os binóculos digitais para se ver onde pisa. Mídias sociais ajudam (e muito!), mas jamais substituirão as conexões pessoais. Ou você viu um grande negócio sendo fechado via Snapchat? Não dá! Que tal investir mais tempo em planos concretos, projetos de vida e potencializando suas iniciativas com “acabativas”? Produtividade é resultado da competência focada. Se for necessário, é melhor reduzir a marcha na inebriante pista supersónica das atualizações nas mídias sociais a fim de arejar, planejar e refletir sobre o que, consistentemente, vale a vida. Sem contar que a agenda-do-dia voará a terabytes por segundo.

VIDA QUE SEGUE. O mais surpreendente de tudo? O mundo não parou, amigos não desapareceram, mantive meu emprego, nem as contas deixaram de ser pagas por causa desta “carta de alforria virtual” que me desenjaulou saudavelmente. Senti-me ainda mais criativo e fortalecido para olhar menos os outros e valorizar mais o que sou. Quer mais? Não é para menos que o Livro mais “real” do universo nos alerte há milênios: ame o próximo, sim! Preocupe-se, interesse-se e interaja com ele, MAS na medida que você ama, valoriza e se realiza consigo mesmo (Mateus 22:39 adaptado). A fórmula não muda: felicidade é a plenitude de espírito feita da paz de contemplar sonhos divinos conectados com atitudes humanas. Explore o que é poderoso: o equilíbrio pessoal blindado no livre-arbítrio que se liberta de qualquer extremismo. E a vida on-line? Que seja facilitadora da incrível e desafiadora existência off-line. Afinal, redes sociais são excelentes redes de pesca para despertar o interesse por Deus, reencontrar bons amigos, e construir diálogos com boas informações.

Que tal, a carapuça também lhe serviu? Se for difícil se enquadrar na Zona do Bom Senso Virtual, fale comigo. Pedirei para minha filha propor um infalível Detox Digital para você também!

Odailson Fonseca