“Esperei com paciência no Senhor, e ele se inclinou para mim, e ouviu o meu clamor. Tirou-me do lago horrível, do barco de lama, pôs os meus pés sobre uma rocha, firmou os meus passos. E pôs um novo cântico na minha boca, um hino ao nosso Deus; muitos o verão, e temerão, e confiarão no Senhor.” (Sl 40.1-3) Ao citar “do lago horrível” e “do barco de lama”, Davi se refere, não literalmente a estes lugares, mas ao estado de suas emoções.  Certamente ele foi um homem marcado por muitos traumas psicológicos, porém, sem dúvida foi vitorioso, veja: ‘’O Senhor é a minha força e o meu escudo; nEle confiou o meu coração, e fui socorrido; pelo que o meu coração salta de prazer, e com o meu canto O louvarei.’’ Salmo 28:7.

 

O que é um trauma psicológico?

pessoa com o rosto triste - traumas psicológicos
Foto: pixabay.com | por Anemone123

A palavra “trauma” em sua raiz etimológica grega significa lesão causada por um agente externo. O trauma psicológico é um tipo de dano emocional que ocorre como resultado de algum acontecimento. Inegavelmente pressupõe uma experiência de dor e sofrimento emocional ou físico. Como experiência dolorosa que é, o trauma acarreta uma exacerbação do medo, o que pode conduzir ao estresse, envolvendo mudanças funcionamento neuropsicológico e afetando o comportamento e o pensamento, que fará de tudo para evitar reviver o evento que lhe traumatizou.

O trauma pode ser causado por vários tipos de eventos, mas há alguns aspectos em comum. Geralmente envolve o sentimento de completo desamparo diante de uma ameaça real ou imaginária à própria vida, ou à vida de pessoas amadas. Além disso, um trauma pode frequentemente violar as ideias do indivíduo a respeito do mundo, colocando-o num estado de extrema confusão e insegurança.

 

Causas dos traumas psicológicos

Algumas das possíveis causas de traumas psicológicos são: perda de entes queridos, abuso sexual, violência ou ameaças, desilusão, mudança repentina, especialmente se ocorrem na infância ou adolescência; eventos catastróficos como desastres naturais, guerra ou outras formas de violência em massa também podem causar traumas psicológicos, assim como exposição à miséria durante longo tempo ou mesmo abuso verbal. Entretanto, pessoas diferentes reagem de maneiras diferentes em eventos similares. Uma pessoa pode sentir como traumático um evento que outra pessoa pode não sentir, pois nem todas as pessoas que passam por experiências traumáticas podem se tornar psicologicamente traumatizadas.

Um trauma pode nascer quando uma perturbação a nível cognitivo desequilibra um estado emocional frágil. Pessoas com traumas psicológicos podem apresentar transtornos somatoformes (sintomas físicos desencadeados pela mente) como enxaquecas, gastrite, alergias e palpitações. Eventualmente são subdiagnosticadas pela desinformação sobre os possíveis impactos do trauma na saúde.

As múltiplas expressões secundárias ao trauma diminuem as chances para o diagnóstico efetivo ocorrer. Dessa forma quadros mais conhecidos como a depressão, enxaqueca, são diagnosticados.

 

Memória traumática

Eventos estressores em si não levam obrigatoriamente à manifestação de traumas psicológicos, pois experiências intensas disparam efeitos variáveis de acordo com as defesas e recursos psicológicos de cada pessoa. Nossas defesas psicológicas são aprendizagens desejáveis, afinal são formas de pensar de superação de um problema ou dor, recursos construídos ao longo do tempo.

Em situações de dor intensa tais defesas e recursos psicológicos podem não ser suficientes, o que traz as consequências desagradáveis a quem está sendo alvo. Uma das formas de manter o trauma ativo são as memórias que vêm carregadas de imagens, emoções dos eventos traumáticos do passado revividos no momento atual, por intermédio de sintomas, tais como:

  • Comprometimentos cognitivos (confusão mental, desorientação temporal, dificuldade de concentração e de tomada de decisões, dificuldade de expressar pensamentos, diminuição na percepção, pesadelos, aumento de preocupações).
  • Comprometimentos emocionais (ansiedade, apreensão, culpa, desamparo, desesperança, desespero, irritabilidade, negação, pânico, raiva, tristeza).
  • Comprometimentos físicos (abuso de drogas para buscar alivio, alterações cardiovasculares, estado de alerta e hiperatividade, fadiga, fraqueza, insônia, perda da energia sexual, distúrbios alimentares, somatizações como dor de cabeça, desconfortos gástricos, diarreia, dor de estômago, náusea).
  • Comprometimentos interpessoais (aumento de conflitos nos relacionamentos sociais pela baixa tolerância, isolamento, prejuízo do desempenho profissional, recusa ou dificuldade em seguir regras ou ordens).

A lembrança específica de memória traumática pode disparar a formação de padrões defensivos de comportamento (medos exagerados em situações que não mais oferecem riscos), que não são apropriados ao momento atual, contribuindo com alterações ao equilíbrio psicológico, biológico e social da pessoa.

 

Tratando os traumas psicológicos

O expressivo número de pessoas afetadas pelo trauma psicológico requer tratamento especializado. A psicoterapia tem sido indicada como a primeira linha de tratamento ao trauma, por ser a estratégia mais relevante para diminuição do risco de cronicidade. O tratamento adequado precoce pode evitar a configuração do Transtorno de Estresse Pós Traumático (quadro mais severo do trauma). O papel do psicólogo nos atendimentos é o de aliviar culpas irracionais, que muitas vezes interferem no desejo de recuperação do paciente; possibilitar a expressão da dor; reconhecer e autorizar o sofrimento; ajudar as pessoas a encontrarem respostas e a restabelecerem o seu funcionamento após o trauma vivido, identificando seus recursos internos, permitindo que o paciente vivencie e elabore perdas e lutos.

Os principais resultados observados da psicoterapia são: aumento da tolerância à frustração, melhora da motivação, redução (e até desaparecimento) dos sintomas. Ademais, é possível atenuar o aparecimento de psicopatologias, tais como: depressão, doenças psicossomáticas, alcoolismo, transtorno de ansiedade e transtorno de estresse pós-traumático.

É importante buscar um sentido de coerência interna diante dos traumas, pela capacidade de pensar, sentir e agir que somos dotados, a médio e longo prazo conforme o impacto do trauma causado na vida de cada um e como foi interpretado e recebido no seu interior.

 

Aprendendo a lidar com os traumas

Cada pessoa vai buscando alternativas para lidar com os acontecimentos, dentro dos seus limites.

“A perda de uma pessoa querida é sempre um grande golpe. Perdi meu marido no auge da juventude e do nosso amor. Meu caçula tinha apenas três aninhos. Anos passaram… e há um ano, uma dor imensa tomou conta do meu coração. A perda trágica em acidente de carro, do meu caçulinha com 19 anos. Foi arrancado um pedaço de mim, fiquei sem chão, não sabia sequer para onde olhar… Busquei caminhos de superação por todos os lados. Depois de 6 meses procurei por psicoterapia. A fé em Deus, a família, os amigos e os encontros com a psicóloga, estão me dando forças para seguir em frente. Sei que certamente a dor da saudade não passará, no entanto o sofrimento diminui aos poucos.”

 

Pensamentos Pessimistas

“Fui usuário de drogas e, na adolescência,tive uma experiência traumática em uma das viagens que fiz. Depois de 9 anos de depressão e crise do pânico ainda não entendia por que sofria tanto. Até que encontrei o tratamento que salvou a minha vida. Cheguei, como em outros processos anteriores, vulnerável e descrente. Nos primeiros encontros o psicólogo me disse que esses comportamentos não se apresentavam à toa e que eu ficaria bem! Eu duvidei, pois há anos não conseguia melhorar.

Na terapia, fui colocando os “pingos nos is”e percebi que as crenças pessimistas tinham uma origem num passado distante. A compreensão e o trabalho com as redecisões no dia a dia foi me libertando das ideias fixas de sofrimento e vulnerabilidade. O que me parecia impossível aconteceu! Hoje eu vivo uma vida feliz e serena. Tenho uma visão realista positiva de mim e do mundo. A família e o trabalho melhoraram por decorrência da minha melhora. Agradeço a Deus por essa oportunidade que eu soube aproveitar!”

 

Juntando os “cacos”

“Minha infância foi à moda antiga dos “bons costumes”. Aprendi com meus pais a ser uma boa e respeitosa menina. Fui muito tímida desde criança. Tornei-me uma esposa prendada, dócil e cuidadosa. Não conseguia dizer não as barbáries do meu ex-marido, que me traumatizaram por 10 anos. Quando cheguei no consultório do psicólogo estava me sentindo como um “cristal quebrado”, totalmente sem possibilidades de juntar os “cacos”. Fragilizada, não confiava em mim e nas minhas possibilidades de reagir a toda violência que sofria.

Lembro perfeitamente que a meta que estabelecemos para minha terapia seria de 30 sessões. Percebi aos poucos que, ao contrário de uma pessoa frágil, eu era muito forte por tudo que aguentei em minha vida conjugal. Lembrei-me na terapia de outras vitórias na escola, com a família, e reconstruí a minha própria imagem. No decorrer das sessões eu me sentia mais e mais forte, exercitava as redecisões e tomava atitudes que surpreendiam a todos que me conheceram como uma mulher passiva… Mudei completamente a minha vida!”

 

Portanto, o ânimo, a esperança, a fé, a simpatia, e o amor promovem a saúde e prolonga a vida. “Um espírito contente, animoso é saúde para o corpo e força para a alma.”Ciência do bom viver, pág. 241.

“O coração alegre serve de bom remédio.’’Provérbios17:22.

 

Evangelista Nilda Aquino
Juliana Assis / Psicóloga (SP)
Revista SOS Mulher – 2018